O STUART CABLE QUE CONHECI POR 25 ANOS - escrito por Kelly Jones
Ele e eu vivemos umas oito casas de distância, durante toda nossa infância, em Cwmaman. Antes mesmo de falarmos sobre a banda, eu podia ficar na casa dele e ele na minha. Primeiro, enquanto crianças, e depois já adultos. Stuart sempre deixava meus pais acordados no andar de cima, com sua voz estrondante sacudindo as vigas enquanto ele falava. Stuart podia entrar no quarto de minha mãe, passar pela cozinha, pegar um Granny Smith, entrar no banheiro, sentar na privada com a porta aberta e continuar falando. E continuou fazendo isso a vida toda. Nos camarins, estúdios, até mesmo na casa de Richard Branson.
Quando a gente era criança, fazíamos fitas. Freebird, Highway to Hell, Deep Purple, Rush — ele amava Rush, AC/DC e Bon Scott. A única vez que o vi envergonhado e fascinado foi quando conheceu o Rush. O irmão dele, Paul, sempre era o primeiro a conseguir os lançamentos e tinha um aparelho de som incrível. Paul tinha um baixo Marlin que Stuart e eu sempre mexíamos. Eu era mais novo, e quando Mabel, a mãe do Stuart, ia ao bingo, sempre me deixavam assistir filmes de terror — Halloween, Night of the Demon, Evil Dead. Eu tenho memórias vívidas de corer prea casa muito rápido. Ele amava comédia: The Young Ones, The Two Ronnies and Morecambe and Wise.
Nós costumávamos passar um tempo no parque do outro lado das nossas casas, perto da piscina, tocando as fitas. Quando eu tinha 10 anos e estava aprendendo a tocar guitarra, ele tinha 14 e estava aprendendo bateria. Nós podíamos ouvir um ao outro, cada um em seu quintal, tentando tocar as músicas do AC/DC. Um dia a gente decidiu tentar toca-las juntos. Nós nos encontramos com o comitê no Top Club, o clube dos trabalhadores no topo da nossa rua. Eles meio que interrogaram a gente comicamente e perguntaram se a gente achava que um dia estaríamos no Top Of The Pops… acho que dissemos que sim.
Então a gente começou a banda. Nós tocamos nosso primeiro show juntos, quando eu tinha 12 e ele 16. Após o show, tivemos de sair, porque éramos muito novos para beber.Nós não podíamos dirigir, então a gente empurrava nosso equipamento pra cima e pra baixo num carrinho de mão barulhento que a rua inteira e todos os jogadores de bingo ainda se lembram, mesmo hoje em dia. Costumávamos pegar muito equipamento emprestado com os membros da banda do meu pai. Ainda me lembro do dia em que a bateria Pearl vermelho-Ferrari do Stuart foi entregue e ele abriu as caixas na rua. A gente sempre falava sobre isso: só a Ferrari fazia aqui tom de vermelho.
Minhas primeiras visitas a Aberdare [perto de Cwmaman] sem meus pais foram com o Stuart. Minhas primeiras visitas a Cardiff sem meus pais foram com o Stuart. Nós comprávamos revistinhas de piadas, com todas as putarias nas piadas e passeávamos por todas as lojas de música, querendo tudo que víamos. A viagem sempre terminava na Caroline Street; uma ruela de restaurantes. Eu pedia frango e torta de cogumelos e batata frita, ele sempre pedia ma ‘salsicha jumbo’ e batata frita. A gente chamava de ‘dobber’ e fritas.
Eu me lembro de quando o Stuart fez um permanente no cabelo, igual ao Kevin Keegan e todos os outros jogadores de futebol da época. A gente jogava futebol de cinco na linha nos centros esportivos de Aberdare e Merthyr. Ele gritava tão alto pela bola e sempre chamava seu nome completo — “KELLY JONES KELLY JONES!” Você sempre ferrava o passe, porque ele sempre fazia você pular uma milha de distância antes de passar.
Fomos para bandas diferentes, mas sempre acabávamos fazendo coisas juntos. De certa forma, Stuart foi o primeiro fã das minhas letras. No início, eu nunca era o autor das letras — Stuart era, ou o Nicholas Geeke, mas quando eu saí da escola e já tinha alguns anos no colegial, comecei a escrever.
Ele amava letras. Dylan, Neil Young, Tragically Hip, Bon Scott — um baterista ouvir as canções é raro. Só recentemente, enquanto gravava um episódio do Songbook para Sky Arts, eu elogiei o Stuart sua faceta de tocar como um baterista que ouvia uma canção e entendia seu significado. Foi a reação dele a minhas letras de “Billy Davey’s Daughter”, “Local Boy in the Photograph” e “Poppy Day”, que me fez perceber que eu tinha algo de bom.
Como eu disse, eu era mais novo. Eu me inspirava nele e nos outros meninos e irmãos. Stuart sempre tentava me fazer deixar o cabelo crescer de algum jeito, ou me vestir de um jeito qualquer. Nós compramos tantas roupas de segunda mão. A camiseta Safeway no vídeo de “Local Boy” era do Stuart. Ele sempre disse que eu tinha sorte porque eu tenho uma falha entre os dentes e quando eu tinha 17 ele me disse que a gente ia conseguir.
Nós fizemos alguns curtas juntos na minha época da escola de arte. Ele era, normalmente, meu diretor, muito natural como ator. Nós compramos o segundo álbum do Pearl Jam juntos, no dia do lançamento, na HMV Queen Street Cardiff naquela época. E foi aí que a gente começou a levar a sério. Nós fomos a shows no Finsbury Park para ver Neil Young e Pearl Jam e ainda assim; mesmo com todo o trabalho dele, meu estudo na escola de arte e trabalho no mercado, nós ensaiávamos todo domingo e quinta-feira.
Stuart nunca estava pronto. Era a mesma coisa toda semana. Quinta-feira ele estava dormindo no sofá, depois de ter trabalhado entregando merenda escolar. No domingo ele atendia só de cueca e com os cabelos bagunçados. A saudação era sempre “Que horas, então?”. Eu respondia — “6 da tarde” se era quinta-feira, “12 horas” se era domingo. Ele me pedia pra entrar, comia um saquinho de batatinhas e a gente saía. Nas quintas a gente ia ao Ivy Bush após os ensaios, bebíamos um pouco e sonhávamos. A galera ficava puta e chamava a gente de Bono e the Edge. A gente concordava que isso sempre tinha que ser em relação às músicas. Tinha que ser canções boas. Mas Stuart queria ser famoso também. Rich e eu nunca nos importamos de verdade. Mas desde que eu me lembro, Stuart praticava seu autógrafo. Era melhor que o logo da Coca-Cola, incrível!
Seu estilo na bateria era próprio, mas sua perna direita e o jeito que ele tocava 4-4 era do Phil Rudd do AC/DC. Você não consegue dar nome a 10 bateristas que se pode identificar quem é só de ouvir, e Stuart era um deles. Ele tinha seu próprio tom, suas expressões e jeito de showman. Muito veio de Gordon Downie do Tragically Hip.
Quando a gente colocava tudo junto, com Rich [Richard Jones, o baixista do Stereophonics] batendo nas quatro cordas ao mesmo tempo, e o jeito que eu cantava, nós tínhamos nossos próprios sons e personagens. Nossa banda inteira tinha um som único. Ninguém soava como a gente naquela época. E foi assim que depois de quase dez anos juntos, conseguimos um contrato com uma gravadora.
Fomos muito prejudicados várias vezes. Empresários e promotores de evento ruins; dormindo no chão de várias pessoas. A gente sempre apoiava um ao outro. Se batia a vontade de desistir, Stuart me apoiava, e se a gente achava que algo era sem sentido, a gente dizia a ele que fazia sentido. Tinha sempre alguma coisa levando a gente a algum lugar. Éramos uma banda com três personagens muito diferentes que se contrapunham perfeitamente. Richard é a alma da banda e era a calmaria entre nossas tempestades de paixão, ânsia, raiva, frustração e amor por ter nossa banda em evidência. Nós podemos dizer honestamente, com a mão no coração, que nós três nunca tivemos uma discussão acalorada. Éramos telepatas. A gente já sabia se alguém estava chateado ou puto e respeitávamos um ao outro.
Voamos pelo mundo todo juntos. Dividimos quartos como os três ursos. Quando saímos em turnê pela primeira vez, a gente nem quis quartos separados. Ganhamos troféus e prêmios. Fomos pro primeiro lugar nas paradas. E, às vezes, o show atrapalhava a bebedeira. Todos nós gostávamos de uma bebida, principalmente as vindas dos vales, e de levar todos os nossos amigos e irmãos na estrada conosco. A gente cuidava um do outro.
Então, todos começamos a crescer — e crescer também na visão do público. A banda ficou “grande”. Nenhum de nós sabia como lidar com isso. Acabar relacionamentos com nossas namoradas de muito tempo. Se mudar. Manter o sucesso. Nós dissemos muita coisa estúpida na imprensa. Olhando para trás, realmente era muita coisa para lidar. Mas foi quando nos tornamos homens. Se casar, viver com a namorada na nossa primeira casa ... Isso colocou a galera sob um tipo diferente de pressão e eu não acho que percebíamos que isso mudou a gente.
Stuart sempre amou seus brinquedos. Ele queria uma casa grande, carros grandes, clubes, flats na baía de Cardiff, shows de TV, botes — tudo! Isso me fazia rir e ainda faz. E ele foi e conseguiu! E “fair play” para ele.
Então Stuart ficou confortável e amando o que ele alcançou e achou que era mais difícil continuar viajando para longe; ele não parecia mais tão ambicioso. Ele estava ocupado fazendo um monte de coisas e Rich e eu sentíamos que estávamos perdendo oportunidades. Também, ter Cian, o filho dele, fazia com que fosse mais difícil para ele. Ele me disse naquele dia que eu entenderia e quando eu tive minhas filhas, realmente entendi. É uma balança que você luta para equilibrar e é uma coisa muito difícil de se fazer, deixar nossas crianças para fazer turnê em algum lugar distante, como a Austrália. Ainda é um desafio nesses dias, mas é o nosso trabalho. E é o melhor trabalho do mundo e nenhum de nós quer voltar a ter os trabalhos que tínhamos antes; então temos que trabalhar para merecer.
Após uma série de tentativas de reconciliar essas diferenças comprometimento, nós acabamos falhando e na véspera de outra turnê mundial, a “casa caiu” e resultou em uma separação pública — uma separação que não foi bem processada por nenhum de nós. Nós adorávamos um ao outro e ninguém queria que isso fosse além, mas às vezes simplesmente não dá. O tempo passou, a imprensa fez da separação o que bem quis, mas a verdade é que apenas três pessoas sabem o que aconteceu e assim vai ficar.
Stuart e eu nos encontramos de novo 18 meses depois da separação em um banheiro do Shepherds Bush Empire num show do Tragically Hip. Eu estava usando uma jaqueta branca e entrei. As pessoas viram a gente e acharam que ia rolar porrada. Mas Stuart deu um sorriso forçado e disse: “tá vendendo sorvete?” e nós dois começamos a gargalhar. E assim foi. As pessoas leram isso ou aquilo, mas quando se cresce junto e passa por tanta coisa junto também, não dá para enterrar as algumas. Stereophonics é uma banda. Stuart e eu éramos como irmãos. Eu, Stuart e Richard passamos a juventude e o fim da adolescência juntos, sete dias por semana!
Desta noite em diante, que foi há muito tempo, nós continuamos em contato. A gente se encontrava em algumas ocasiões. Ele encontrou Javier [Weyler, o agora baterista do Stereophonics] e eu numa noite em Cardiff depois do rugby. Ele ligou para mim na noite que nós tocamos no Cardiff Castle ano passado e eu me sentei na recepção do St David’s Hotel falando ao telefone com ele por mais ou menos meia hora. A gente riu muito do estado que todo mundo estava porque foi um show em plena tarde.
Escrevo isso e ainda não acredito que ele se foi. Estou olhando uma foto com Stuart, Richard, eu e um cara de lá chamado Murphyn Owen, mostrando a bunda e Stuart apontando para a bunda do Murphyn. Stuart era um gozador. Ele era o centro das atenções, mas era mais que isso. Ele era um homem muito sensível de várias maneiras diferentes. Ele não era sempre o Stuart barulhento, sorridente e público que as pessoas viam. E ele não deixava que muitas pessoas vissem esse “outro ele”.
Ele era meio que um meio termo entre dois mundos. Vivendo o mito do Rock ‘n Roll numa mão e sendo a criança de Glanaman Road na outra. A gente dividia longas jornadas juntos numa van e a maioria das minhas memórias de Stuart e eu são naquela van, segurando o rádio cassete pra fazer funcionar. Rich and Stu na frente e eu no banco de trás com o equipamento.
Falávamos sobre contra histórias e fazer filmes – ele amava filmes que tinham boas reviravoltas e gostava de caras como Roald Dahl. Ele amava seu esporte, seu rugby. A gente ria de pessoas que conhecíamos e achávamos a chave para a suas idiossincrasias, observando o personagem neles. Nós três éramos muito bons em julgamento de caráter. Ele tinha muito mais sobre ele do que as pessoas jamais viram – como todos nós, eu acho.
Eu fui ver Cian de novo, no dia que o Stuart morreu. Cian não me via fazia uns anos, e me perguntou quantos carros eu tinha, o tamanho da minha casa... onde era o estádio que eu brincava com o pai dele. Ele foi adorável. Então ele foi lá e pegou suas guitarras e começou a tocar “Smoke on the Water” numa corda só, exatamente como o Stuart costumava fazer no baixo Marlin do Paul. Cian tem o sorriso do Stuart e uma postura completa; e como Nicola — mãe do Cian — disse, através de Cian você pode ver Stuart todo dia.
A última vez que ouvi notícias dele foi na sexta-feira antes dele morrer. Ele me desejou um feliz aniversário e sorte a todos nós no show no estádio de futebol de Cardiff, e também perguntou como seria o funeral do meu tio Rees. Eu contei os detalhes pro Stuart e ele me mandou um torpedo: “Louco! Te vejo lá!”
Se você conhecia Stuart, sabia que ele amava um casamento e um funeral, porque são os únicos lugares que adultos se encontram e ficam putos juntos depois que se tem crianças. Eu gargalhei com a mensagem. Porque, obviamente, não havia nada de “louco” nisso, mas Stuart e eu sabíamos exatamente o que ele quis dizer.
A última vez que os caras da banda inteira se viram foi no casamento de Dave Roden, nosso engenheiro de som. E naquela noite nós três tocamos juntos de novo pela primeira vez desde a separação. Nós tocamos umas 4 ou 5 músicas, ficamos bêbados e falamos sobre os velhos dias.
Eu podia continuar e continuar — eu tenho 25 anos de memórias que vou guardar como tesouro.
Stuart, eu e Richard sempre amaremos você. Agora, por fim, finalmente deite sua cabeça e descanse em paz.
FIM.
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Tradução - A. Júnior, dono da comunidade Stereophonics Fãs do orkut. Acesse a comunidade Stereophonics Fãs do orkut clicando aqui